Denúncias de possíveis infrações disciplinares são apuradas por sindicâncias, as quais podem ou não levar à aplicação de sanções leves ou à instauração de um PAD (processo administrativo disciplinar).
As suspeitas de infração aos deveres e às proibições do regime disciplinar do RJU federal (Lei nº 8.112/1990) são apuradas através de três instrumentos:
- denúncia;
- sindicância;
- processo administrativo disciplinar (PAD).
Na denúncia, a Administração Pública limita-se a receber a notícia de indícios de infração.
Na sindicância, a Administração apura a denúncia, os indícios, determina se houve a infração e, em tendo havido, aplica sanções disciplinares leves.
No processo administrativo disciplinar, além de apurar denúncias e indícios, a Administração Pública determina se houve ou não uma infração e, em tendo havido, aplica sanções disciplinares graves.
Você estudará agora a denúncia e a sindicância, ambas mais simples. Para estudar do PAD, veja “Processo administrativo disciplinar (PAD).”
Denúncia
A apuração de indícios de irregularidades no serviço público é uma obrigação da autoridade competente para tal, sem espaço para discricionariedade (art. 143, Lei nº 8.112/1990).
Diante de indício de infração, a autoridade pública tem o poder-dever de apurar e, encontrando infração e quem seja por ela responsável, tem o poder-dever de aplicar sanção disciplinar.
Em certo contraste com essa animação toda de apurar e punir, dispõe a Lei nº 8.112/1990, quando trata das denúncias:
Art. 144. As denúncias sobre irregularidades serão objeto de apuração, desde que contenham a identificação e o endereço do denunciante e sejam formuladas por escrito, confirmada a autenticidade.
Parágrafo único. Quando o fato narrado não configurar evidente infração disciplinar ou ilícito penal, a denúncia será arquivada, por falta de objeto.
O art. 144 coloca quatro condições para que a Administração Pública apure uma denúncia de infração funcional:
- o denunciante deve identificar-se e dizer seu endereço;
- a denúncia deve ser formulada por escrito;
- a autenticidade da denúncia (o que deve abarcar os dados pessoais do denunciantes) deve ser comprovada;
- o conteúdo da denúncia deve mostrar uma evidente infração disciplinar ou um evidente ilícito penal.
O que a lei obscurece é se, descumprido algum desses requisitos, pode a Administração Pública desconsiderar a denúncia, e seguir a vida como se de nada soubesse.
Hoje em dia, tem ficado forte a ideia de que qualquer cidadão pode denunciar indícios de infrações na Administração Pública e todas as denúncias devem ser apuradas.
Esse fortalecimento tem se revelado na estruturação do sistema administrativo e na busca de eliminação do abuso de poder na Administração Pública.
A meu ver, o art. 144 da Lei nº 8.112/1990 cultiva certo desalinho em relação a essas novidades da primeira década do século XXI, pois pode vir a ser usado de entrave à apuração de denúncias.
Sindicância
A sindicância é usada na apuração de infrações e na aplicação de sanções disciplinares leves, aquelas que variam entre advertências e suspensões de até 30 dias (art. 145, II, Lei nº 8.112/1990).
1. Duração da sindicância
Uma sindicância pode perdurar 30 dias, prorrogáveis uma única vez por igual período.
2. Resultados da sindicância
O resultado de uma sindicância varia conforme o que for concluído na apuração.
Se a conclusão for de que os indícios de infração são infundados, haverá arquivamento.
Se a conclusão for de que houve uma infração disciplinar punível com advertência ou suspensão de até 30 dias, abre-se espaço para contraditório e ampla defesa, podendo então resultar na aplicação de uma das sanções leves.
Se a conclusão for de que houve uma infração disciplinar punível com suspensão por mais de 30 dias ou demissão, instaura-se um PAD (processo administrativo disciplinar), durante o qual (o PAD) haverá contraditório e ampla defesa.
Em caso de instauração de PAD, a sindicância passa a integrá-lo como peça de instrução, porém, não o vincula de forma alguma, tanto que o STJ (Superior Tribunal de Justiça) tem considerado válido que o PAD apure novas infrações além daquelas que constarem da sindicância.
3. Como fica o contraditório e a ampla defesa na sindicância?
A sindicância inicia como um procedimento inquisitorial, sem caráter sancionatório, e assim perdura enquanto estiver apurando a infração.
Enquanto se dedica exclusivamente à apuração da infração, a sindicância não tem contraditório nem ampla defesa ao investigado.
Confirmada a infração, a sindicância pode converter-se em procedimento sancionatório (e aplicar sanções leves) ou ceder lugar a um PAD.
Se a sindicância converter-se em procedimento sancionatório (para aplicação de sanções leves), ela deve abrir espaço para contraditório e ampla defesa ao investigado. Só depois aplicar, se cabível, pode da sindicância resultar a aplicação da sanção disciplinar.
Se a sindicância, por outro lado, ceder lugar a um PAD, ela não concederá contraditório e ampla defesa ao investigado, pois que este terá esses direitos garantidos no PAD recém instaurado.
4. Comunicação ao Ministério Público Federal
Sempre que confirmada a infração e esta puder ser tipificada como ilícito penal, a autoridade pública deve comunicar o Ministério Público Federal, encaminhando-lhe cópia dos autos da sindicância.
A sindicância é uma etapa do PAD?
Não, jamais.
Um PAD pode ser instaurado sem sindicância prévia, bastando a suspeita razoável da gravidade da possível infração.
O ideal é usar a sindicância para apurar infrações leves e o PAD para infrações graves. Porém nenhum vício haveria em usar o PAD para apurar uma infração que se revele depois como leve, ou mesmo que desde o início se saiba leve.
O que não pode é o contrário: em revelando-se, no correr da sindicância, a gravidade da infração, aplicar-se, na sindicância, sanção disciplinar mais grave do que advertência ou suspensão de até 30 dias. Deve-se encerrar a sindicância e instaurar o PAD.